Enquanto Javier Milei corta gastos, fecha ministérios e congela aposentadorias desde 2023, a inflação desacelera, mas a pobreza explode, universidades entram em colapso financeiro, empresários aplaudem a guinada liberal e milhões de argentinos lotam as ruas em protestos contra cortes sociais e futuro incerto das famílias em todo o país
Desde que venceu as eleições presidenciais na Argentina, em novembro de 2023, Javier Milei adotou um programa de choque para atacar a inflação crônica e o rombo das contas públicas. Ministérios foram extintos, subsídios cortados, estatais ameaçadas de privatização e benefícios sociais encolhidos, numa combinação de medidas que o próprio governo chama de “motosserra” contra o Estado.
Um ano depois, a inflação começa a recuar e alguns indicadores macroeconômicos mostram alívio, mas o preço social da estratégia é pesado. Javier Milei governa um país em que a pobreza cresce, aposentados protestam semanalmente, universidades relatam asfixia financeira, cozinhas solidárias lotam e o debate público se divide entre quem vê na agenda liberal a última chance de salvação e quem enxerga apenas destruição de direitos.
A motosserra econômica de Javier Milei
Logo nos primeiros meses de governo, Javier Milei desmontou estruturas centrais do Estado argentino. Cortou ministérios, reduziu de forma agressiva verbas para políticas sociais e suspendeu reajustes automáticos em áreas sensíveis, prometendo eliminar privilégios da “casta política” e reduzir o tamanho do governo.
Entre as medidas mais simbólicas estão a extinção de pastas inteiras, o bloqueio de contratações e a revisão de contratos públicos. Para o presidente, menos Estado significa menos déficit e, no futuro, menos inflação; para servidores e beneficiários, significa perda imediata de renda, empregos e serviços.
Inflação em queda, mas comida e contas continuam pesando
A promessa central de Javier Milei era domar a inflação que já ultrapassava a casa dos três dígitos anuais. Com o ajuste duro, a alta de preços começou a desacelerar, especialmente para grandes empresas que negociam insumos no atacado e conseguem planejar custos com mais previsibilidade.
Na prática, porém, o alívio nos índices não se traduz, no mesmo ritmo, em comida barata. Salários continuam corroídos, tarifas de serviços públicos subiram com a retirada de subsídios e muitas famílias passaram a depender de doações para garantir refeições completas. A estatística oficial mostra melhora, mas o carrinho de compras do argentino médio continua mais vazio, alimentando frustração e sensação de injustiça.
Empresários empolgados com a guinada liberal
Enquanto parte da população sente o aperto, uma fatia importante do empresariado celebra Javier Milei. Donos de indústrias, redes de varejo e exportadores do agronegócio veem na agenda liberal uma oportunidade de reduzir impostos, flexibilizar regras trabalhistas e atrair capital estrangeiro.
Empresários afirmam que a previsibilidade fiscal e uma inflação menos agressiva permitem planejar investimentos, ampliar fábricas e disputar mercados externos. Para eles, o governo finalmente fala a linguagem do mercado, corta amarras burocráticas e tenta transformar a Argentina em destino atrativo para grandes projetos internacionais.
Universidades em crise e ciência ameaçada
Se o setor privado vibra, as universidades públicas se tornaram um dos epicentros da resistência ao governo Javier Milei. Com cortes e congelamentos orçamentários, reitores relatam falta de recursos para manter laboratórios, bolsas de pesquisa e programas de assistência estudantil.
Estudantes denunciam que cursos estão sendo enxugados, projetos interrompidos e atividades de extensão canceladas. A ideia de que a universidade é motor de mobilidade social e inovação entra em choque com a visão de um Estado mínimo, e campus tradicionais passam a depender de protestos e negociações permanentes para seguir funcionando.
Aposentados nas ruas e o conflito em torno dos benefícios
Outro grupo fortemente atingido pelas medidas de Javier Milei são os aposentados. Regras de reajuste foram revistas, projetos de aumento real foram vetados e benefícios complementares sofreram cortes ou atrasos, o que empurrou idosos para manifestações frequentes em Buenos Aires e em outras cidades.
Muitos aposentados afirmam que trabalharam a vida inteira e agora não conseguem pagar aluguel, remédios e alimentação com o que recebem. As marchas de idosos com cartazes e panelas batendo em frente ao Congresso se transformaram em imagem recorrente de um país em que o ajuste fiscal recai justamente sobre quem tem menor capacidade de reação.
Cozinhas solidárias, igrejas cheias e o avanço da pobreza
Com o recuo de programas sociais e aumento de preços, cozinhas solidárias e paróquias assumem uma parte do papel do Estado. Voluntários servem refeições para famílias que não moram na rua, mas já não têm dinheiro para comprar comida suficiente. Crianças em situação de desnutrição voltam a ser atendidas por obras de caridade em bairros populares.
Na Argentina de Javier Milei, filas em refeitórios comunitários crescem ao mesmo tempo em que o governo defende cortes adicionais e fala em “equilibrar as contas”. A tensão entre o discurso técnico da equipe econômica e a realidade de quem precisa de prato de comida diário alimenta a percepção de que o ajuste foi longe demais para os mais pobres.
Um país dividido entre esperança e revolta diária
O resultado é uma Argentina profundamente dividida. De um lado, apoiadores de Javier Milei acreditam que o país precisa atravessar um período de sacrifício para, mais à frente, colher frutos de uma economia mais aberta, com menos burocracia e menor inflação.
Do outro, sindicatos, estudantes, aposentados e parte da classe média denunciam destruição de direitos históricos, sucateamento de serviços públicos e aumento acelerado da pobreza. Protestos quase diários, greves e marchas compõem o novo cotidiano argentino, em que esperança de recuperação e revolta contra os cortes caminham lado a lado.
Diante desse cenário, na sua opinião Javier Milei está realmente colocando a Argentina em um caminho de recuperação sustentável ou o custo social dos cortes já ultrapassou o limite do que uma sociedade consegue suportar em nome do ajuste econômico?

