Anúncio da ABBC em 9 de dezembro mostra que a nova regra do FGTS, com piso de 100 reais por parcela e limitações rígidas, derrubou contratações, estrangulou CLTs negativados e ameaça reduzir a 5 por cento a oferta desse crédito vinculado ao Saque-Aniversário para trabalhadores de baixa renda no Brasil
Dados divulgados pela Associação Brasileira de Bancos em 9 de dezembro de 2025 indicam que a antecipação do Saque-Aniversário despencou 80% após a nova regra do FGTS entrar em vigor. O volume mensal, que girava em torno de 3 bilhões de reais, caiu para aproximadamente 600 milhões de reais em novembro, sinalizando um tombo histórico em uma das linhas de crédito mais usadas pelos trabalhadores CLT endividados.
As mudanças, aprovadas em outubro com o argumento de limitar o uso do FGTS como garantia de crédito, criaram um novo cenário. A nova regra do FGTS não extingue o Saque-Aniversário, mas impõe um conjunto de travas que reduzem o público elegível e afetam diretamente trabalhadores de menor renda, muitos deles negativados, que usavam a antecipação como alternativa a empréstimos mais caros e com juros elevados no sistema financeiro tradicional.
O que mudou com a nova regra do FGTS
Segundo a ABBC, a nova regra do FGTS introduziu uma série de restrições que alteram a lógica da antecipação. O objetivo oficial é reduzir o uso indiscriminado do saldo como garantia, mas o efeito imediato foi a compressão do crédito para quem mais dependia desse mecanismo. Entre as principais mudanças estão:
Carência obrigatória de 90 dias entre a adesão ao Saque-Aniversário e a contratação da antecipação
Limite máximo de até cinco anos de parcelas antecipadas até outubro de 2026, com redução para três anos a partir de novembro de 2026, substituindo o modelo anterior em que o trabalhador podia antecipar praticamente todo o saldo disponível
Exigência de valor mínimo de 100 reais e máximo de 500 reais por parcela anual, o que exclui saldos muito baixos e reduz o tíquete em faixas intermediárias
Restrição a apenas uma operação por trabalhador, impedindo contratações sucessivas ou ajustes ao longo do tempo
Na prática, a nova regra do FGTS desloca a modalidade de um crédito amplo e flexível para um produto mais restrito, com acesso condicionado a saldos maiores, planejamento prévio e maior disciplina financeira, o que não corresponde à realidade de boa parte dos CLTs que vivem em aperto permanente.
Saque-Aniversário deixa de ser “crédito de sobrevivência”
Antes das mudanças, a antecipação do Saque-Aniversário funcionava como uma espécie de “crédito de sobrevivência” para milhões de trabalhadores. Com juros comparativamente mais baixos do que o rotativo do cartão ou o cheque especial, a linha se consolidou como opção para negativados e para quem não conseguia aprovação em outros produtos do mercado.
A ABBC aponta que as contratações despencaram de 3 bilhões para 600 milhões de reais em um único mês, e projeta que as concessões podem cair para cerca de 5% do volume anterior, tornando a modalidade quase residual. A própria entidade alerta que a nova configuração atinge justamente quem vinha utilizando o Saque-Aniversário como saída para dívidas emergenciais, contas atrasadas e recomposição mínima do orçamento doméstico.
A nova regra do FGTS mantém o discurso de preservação do fundo e de proteção ao trabalhador contra endividamento excessivo, mas a execução afeta a oferta de crédito barato em um momento em que outras linhas, como o novo consignado privado batizado de Crédito do Trabalhador, ainda não alcançam a mesma capilaridade junto ao público de baixa renda.
Perfil de quem mais sofre com as novas travas
Os dados apresentados pela ABBC ajudam a entender por que a nova regra do FGTS é vista como um choque para uma parte específica do mercado de trabalho. Do universo de 134 milhões de trabalhadores com saldo no FGTS, cerca de 85 milhões estão desempregados, sem acesso direto ao novo consignado privado e com menor capacidade de negociar crédito em condições favoráveis.
Entre os 37 milhões de pessoas que aderiram ao Saque-Aniversário, 26 milhões já contrataram alguma forma de antecipação ao longo do tempo. Desse grupo, 74% estão negativados, o que limita fortemente o acesso a outras modalidades de crédito e concentra no próprio FGTS a principal alternativa para renegociar dívidas ou cobrir emergências.
Mesmo dentro desse universo, a ABBC calcula que apenas 25% dos trabalhadores que já anteciparam o FGTS conseguiriam aprovação no novo modelo imposto pela nova regra do FGTS, e ainda assim com juros acima do teto de 1,79% ao mês que vigorava anteriormente. Ou seja, além de reduzir o volume, a mudança tende a encarecer o custo do dinheiro exatamente para o segmento mais vulnerável.
Crédito barato esvazia e pressão cresce sobre o Conselho Curador
Diante desse quadro, a Associação Brasileira de Bancos sustenta que a nova regra do FGTS precisa ser ajustada para evitar a quase extinção prática da antecipação como instrumento de crédito de massa. A entidade projeta que, mantidas as regras como estão, as concessões de Saque-Aniversário antecipado podem encolher a uma fração mínima do que eram, com forte impacto sobre o mercado de consumo de baixa renda.
Do ponto de vista dos trabalhadores, especialmente os negativados, o piso de 100 reais por parcela anual e a limitação de apenas uma operação por pessoa são vistos como os pontos mais penalizantes. Quem tem saldo baixo ou fragmentado simplesmente deixa de ter acesso à antecipação, e quem já fez uma operação anterior perde a possibilidade de recalibrar o fluxo de crédito ao longo do tempo.
Por isso, a ABBC defende que o Conselho Curador do FGTS reavalie dois pilares da nova arquitetura: o piso mínimo de 100 reais e a restrição a uma única operação por CPF. A crítica é direta: mantendo esses parâmetros, a nova regra do FGTS deixa de proteger o trabalhador e passa a funcionar como barreira adicional ao crédito barato em um país com altos índices de informalidade, desemprego e endividamento.
Em um cenário em que a antecipação do Saque-Aniversário desabou 80%, o volume caiu a 600 milhões de reais e a maior parte dos potenciais usuários está negativada, você acha que a nova regra do FGTS cumpre o papel de proteger o trabalhador ou apenas retira um dos poucos créditos mais baratos disponíveis para quem já vive no limite?

