Reportagem mostra como Viver em Londres virou sinônimo de aluguel absurdo na crise dos aluguéis, com pouca habitação social e moradias populares insuficientes.Reportagem mostra como Viver em Londres virou sinônimo de aluguel absurdo na crise dos aluguéis, com pouca habitação social e moradias populares insuficientes.

Com aluguéis em alta recorde e oferta mínima de habitação social, viver em Londres virou corrida desigual por um teto, empurrando adultos de volta para a casa dos pais, aposentada para uma van e milhares para filas com centenas de candidatos por quarto em bairros caros da capital britânica hoje

Nos últimos 30 anos, enquanto a construção de habitação social praticamente parou e milhões de unidades foram vendidas, viver em Londres deixou de ser sonho de classe média e virou projeto de risco. Na prática, o mercado passou a ditar sozinho o preço de cada metro quadrado, e os aluguéis da capital inglesa subiram para patamares entre os mais caros do mundo, numa escalada que se acelerou especialmente no ano passado com taxas de empréstimo mais altas.

Nesse cenário, quase quatro milhões de adultos britânicos passaram a morar na casa dos pais, cerca de 700 mil a mais do que há dez anos, enquanto casos extremos de despejo empurram aposentados para veículos adaptados, estudantes para quartos superlotados e trabalhadores para periferias distantes. A pergunta que se repete entre quem tenta viver em Londres é simples e brutal, como conseguir um teto quando possuir uma casa virou luxo estatístico mais do que projeto real de vida.

Quando viver em Londres exige seis meses de aluguel adiantado

O retrato de Louise Hemfrey ajuda a dimensionar o desajuste. Aos 33 anos, com ensino superior e bom emprego, ela e o namorado Joe passaram dois meses encarando filas com centenas de interessados em cada imóvel até encontrarem um apartamento de um cômodo, com 45 metros quadrados, fora de Londres. O preço, convertido, chega a cerca de 8.600 reais por mês.

Para segurar a chave, o casal precisou pagar seis meses de aluguel adiantado, exigência que se tornou comum em áreas disputadas. Em muitas visitas, ainda tiveram de pagar taxa apenas para entrar na lista de candidatos. Hoje, vizinhos que chegaram depois desembolsam cerca de 2.700 reais a mais pelo mesmo tipo de unidade, o que reforça a percepção de que viver em Londres ou na sua área de influência virou uma corrida de resistência financeira.

Habitação social desmontada e mercado livre em alta

Para a especialista em planejamento urbano Anna Minton, o quadro atual não é acidente, mas resultado de uma política habitacional fracassada ao longo de três décadas. A habitação social, que poderia oferecer algum equilíbrio, foi praticamente desmontada: milhões de unidades foram autorizadas a ser vendidas, e novos projetos quase não saíram do papel nesse período.

Sem estoque público relevante, a crise dos aluguéis transformou viver em Londres em privilégio regulado por um único mantra, o mercado regula. Guindastes pontilham o horizonte da capital e de outras cidades britânicas, mas parte significativa dos novos empreendimentos serve como investimento ou ativo especulativo, com imóveis vazios em bairros inteiros. Para Minton, a solução exigiria intervenção robusta, com controle de preços de aluguel, programa extenso de habitação social e combate direto a especuladores e agiotas que lucram sobre a escassez.

Aposentada despejada, van como casa e rotina de sobrevivência

Na outra ponta da escala, está Lyn Pearman. Aposentada, ela viu o aluguel subir de cerca de 2.700 reais para algo em torno de 4.430 reais e não conseguiu acompanhar a alta. Depois do despejo, vendeu objetos de valor, perdeu o apartamento e passou a viver em um furgão estacionado em Margate, cidade litorânea a duas horas de carro de Londres.

Hoje, a aposentadoria mal cobre o combustível; para alimentação, sobram aproximadamente 65 reais por dia. O banho depende da solidariedade de amigos que ainda têm casa. Lyn, que já trabalhou como personal trainer e cuidou da mãe com demência, transformou a experiência em diário público no TikTok, onde reúne mais de 55 mil seguidores, muitos relatando medo de seguir o mesmo caminho. O caso ilustra como viver em Londres pode terminar numa vida sem teto, mesmo depois de anos de trabalho formal.

Adultos presos entre aluguel absurdo e volta para a casa dos pais

Enquanto histórias como a de Lyn se tornam mais frequentes, milhões de adultos optam por uma saída vista antes como passo atrás, voltar a morar com os pais. O número de pessoas nessa situação cresce desde a última década, pressionado pela combinação de salários congelados, inflação de moradia e exigências rígidas de fiadores e pagamentos antecipados.

Louise e Joe chegaram a simular a compra da casa própria, mas a matemática não fecha. As políticas fiscais consideradas imprudentes elevaram as taxas de empréstimo no último ano, empurrando ainda mais para frente o sonho da propriedade. Em conversas com amigos e colegas, a frase que se repete é que viver em Londres hoje significa abrir mão de quase tudo para pagar o aluguel, ou aceitar morar de volta no quarto da adolescência, mesmo depois de formado e empregado.

Viver em Londres se torna privilégio de ricos e famosos

Enquanto parte da classe média recua, investidores e compradores de alta renda seguem ocupando os bairros mais disputados, onde imóveis vazios funcionam muitas vezes como reserva de valor, e não como moradia real. A sensação entre muitos moradores é a de que Londres caminha para ser uma cidade de ricos, turistas e profissionais de altíssima renda, enquanto o restante da população é empurrado para periferias distantes ou para cidades menores.

Louise resume essa percepção ao dizer que a casa própria se tornou utopia e o aluguel absurdo passou a ser regra. A consequência política é direta, sobretudo entre os mais jovens, que responsabilizam governos conservadores por políticas fiscais e habitacionais que, na avaliação deles, agravaram o problema. Especialistas alertam que, se nada mudar, a falta crônica de moradias populares pode se transformar em força eleitoral capaz de varrer do poder quem apostou por décadas na ideia de que apenas o mercado resolveria onde e como as pessoas conseguem viver em Londres.

Na sua visão, a crise de moradia e o aluguel absurdo que tornam tão difícil viver em Londres devem ser enfrentados com controle de preços, mais habitação social ou mudanças profundas nas regras de investimento imobiliário na cidade?

Autor

  • Bruno Teles

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